terça-feira, 14 de novembro de 2023

últimas gotas e o dilúvio

ontem me deram remédio psiquiátrico.
meu cachorro
não parece se importar.

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justo hoje, of all days,
inventou minha caneta
secar.

é o dia mais quente do ano,
pudera.

é o dia mais quente de mim,
que saco.

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o fluxo está na iminência de 
acabar, sinto na ponta dos dedos.
mas o fluxo parece redescoberto,
sinto em algum lugar.
(erro a métrica 
e que se foda.)

infinito enquanto dure é o caralho.
que seja razoável
enquanto faça sentido.

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a bolinha rola no cartucho.
o barulho, diferente.

quando trocar o cartucho pelo conversor,
usarei tinta nova.
azul turquesa,"é indiana".
não importa. O importante
é renovar o fluxo
e criar novos sentidos.

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sentir sem berebas.
sentir à tinta seca.
lamber a secura da vida
até que o sangue umedeça.
outro dia vi um nenê
na TV. Ri.
achei fofo.

a reportagem era sobre
refugiados de guerra.
Chorei.

não existem definições.
existem combinações.

que merda de combinação
essa em que vivemos.
não?

sexta-feira, 27 de outubro de 2023

a pele se rasgar não posso
o couro reorganizar consigo.

pelas suturas destas mãos
os afetos de um coração
que não sente nada não.

pelos cortes, os desenhos
e as marcas são submetidos.
Importante exercício de potência.
de que serve um caderno
que não é riscado?
de peso.

terça-feira, 24 de outubro de 2023

Já há mais de mês que
antevendo o fim da tinta
comprei novo frasco.

Já há mais de mês vivo 
sob a frustração da tinta
que não acaba

Talvez o problema seja viver a vida
a antever e criando
ciladas de expectativas inúteis.

Talvez o problema seja viver a vida
com poucas antevisões que
forcem exercícios inúteis de escrita.

Viver não é preciso;
Escrever não é preciso;
A tinta não é precisa.

segunda-feira, 24 de abril de 2023

sobre os retornos inúteis e múltiplos

seriam os homens que
cortam grama
os maiores filósofos?
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a grama cresce e o homem
corta-a.
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amanhã haverá grama
por ser cortada. Aos homens
que vivem
a cortar grama
nada falta,
    pois a grama transborda.
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a grama cresce e o homem,
por puro desejo de ser homem,
corta-a.

a grama cresce e o homem,
sabendo que voltará a crescer,
corta-a.

a grama cresce e o homem,
multiplicando a diferença,
corta-a.
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triste tempo de terras secas,
de mundo seco,
de relações secas,
de vidas secas,
em que tão pouca grama há
por cortar.
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cortar a grama como quem
escreve na areia.
viver de deixar pistas,
não marcas.
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a grama cresce e o homem,
por isso (e apenas por isso),
corta-a.
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existir com a sapiência de 
alguém que vive a 
cortar grama
há de ser maravilhoso.
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a grama cresce e o homem
corta-a.

quinta-feira, 30 de março de 2023

contra a filosofia dos ideais

ouvi dizer que a terra,
caso fosse perfeitamente espalhada,
viraria uma bola-oceano
com dois mil metros de profundidade.

dois mil metros de pura água
salgada entre o céu e a 
terra.

sem mistérios ou filosofia,
só água
salgada.

não estaria aqui.

aqui não existiria.

para existir, a terra precisou
ser
imperfeita.

alegre constatação.
hoje quis escrever
só para usar a caneta

escrever sem princípio
nem meio
nem fim

especialmente sem fim

ou talvez com o único fim de gastar tinta

atrevido que sou
topei o desafio
e vim para o computador
digitar no teclado

talvez este não seja meu melhor poema
mas preservou a ponta da caneta

segunda-feira, 27 de março de 2023

acabei de me dar conta
que nunca nem te fiz um caderno.

usava um caderno véio,
reaproveitado de algo que desejava.

um caderno que era resto,
de uma potência por realizar-se.


se ao preenchimento nunca te dei espaço,
agora vejo,
talvez nunca tenha te dado uma chance real.

curioso pensamento para quem vive(u) tão intensamente.

quarta-feira, 30 de novembro de 2022

hoje fiz um desenho e
rasguei

era bonito e
não importa

era como me sentia e
não como sou
    -    não há como sou

se ponho no papel
espero que tenha dignidade e
não se demore e
não fique 

hoje fiz um desenho e
não é mais

que bom